Deixar de fumar engorda?

Deixar de fumar é frequentemente acompanhado por um aumento de apetite, particularmente de alimentos calóricos, o que consequentemente leva ao aumento de peso. Por isso mesmo, existe o receio de que deixar de fumar engorda!

Por este motivo, muitas vezes o aumento de peso é apontado como o principal receio para as pessoas deixarem de fumar, especialmente nos fumadores que apresentam já preocupações com o seu peso. Contudo, é consensual que os benefícios de deixar de fumar superam os possíveis riscos desta decisão.

Benefícios de deixar de fumar

Deixar de fumar apresenta diversos benefícios para a saúde, tais como:

Aumenta o número de anos de vida: os ex-fumadores vivem mais do que os fumadores e as pessoas que deixam os hábitos tabágicos antes dos 50 anos apresentam metade do risco de morrer nos 15 anos seguintes;
Diminui o risco de desenvolver doenças cardiovasculares e doenças respiratórias;
Diminui o risco de inúmeros tipos de cancro, nomeadamente do trato respiratório, gastrointestinal, urinário e ginecológico.

Em relação a deixar de fumar antes ou durante a gravidez, os benefícios são:

Diminui o risco de abortos espontâneos e nados-mortos;
Diminui o risco de crescimento fetal diminuído;
Diminui o risco de baixo peso à nascença;
Diminui o risco de descolamento prematuro da placenta;
Diminui o risco de morte súbita do recém-nascido;
Diminui o risco de asma e outras complicações respiratórias.

Verdade ou mito: deixar de fumar engorda?

Após 1 ano do abandono dos hábitos tabágicos, em média as pessoas ganham entre 4-5kg, existindo casos em que aumentam mais de 10kg.

Após 5 anos do abandono dos hábitos tabágicos, as pessoas chegam a ganhar entre 8-10kg, havendo casos também de pessoas que ganham mais do que 18kg e até mesmo mais de 20kg.

Esta taxa de ganho de peso não é sempre igual: é mais acentuada durante os primeiros 3 meses, com um aumento médio de 1kg por mês, e decresce após este período. É importante realçar também que, em média, os fumadores pesam menos 3-4kg do que os não fumadores.

Fatores que influenciam o aumento de peso

Apesar do cigarro conter mais de 7000 substâncias, pensa-se que a nicotina é a única substância responsável pelas variações do peso, o que é explicado por vários motivos, tais como:

Há diminuição do metabolismo basal

A nicotina presente no tabaco provoca um aumento no metabolismo basal em 5 a 10%.

Quando se larga o tabaco, o metabolismo basal retorna aos valores normais, e as necessidades energéticas e nutricionais para a manutenção do peso corporal diminuem. Estima-se que por si só, este fator seja responsável por 40% do ganho ponderal.

Há um aumento da gordura corporal

A nicotina apresenta um efeito termogénico, ou seja, promove um maior gasto de energia para além do metabolismo basal. Este efeito permite uma maior oxidação lipídica (que corresponde a uma maior utilização da gordura corporal como fonte de energia e, portanto, a um maior gasto), estando associada, por isso, a um menor armazenamento dessa mesma gordura corporal.

Sem o efeito termogénico da nicotina, há uma diminuição deste mecanismo, o que leva a um aumento do armazenamento de gordura, principalmente na zona abdominal.

Há um aumento da ingestão energética

O peso corporal é mantido através de um balanço entre a ingestão e o gasto energético. A ingestão alimentar é controlada a partir da ação coordenada de vários sinais metabólicos do sistema nervoso central, que regulam estímulos como a fome e a saciedade.

A nicotina exerce os seus efeitos na libertação destes sinais metabólicos, contribuindo para uma menor estimulação da fome e do apetite. A nicotina induz assim uma redução do apetite. Deste modo, na ausência desta, este efeito deixa de acontecer, contribuindo para o aumento do apetite e, por sua vez, da ingestão energética.

Para além disso, o aumento da ingestão energética é também consequência de uma resposta hedónica aos alimentos, ou seja, uma resposta ao prazer obtido através da ingestão de alimentos. Tanto os alimentos, principalmente os ricos em gordura e açúcares, como a nicotina, levam à libertação de substâncias semelhantes no cérebro como a serotonina e a dopamina, que proporcionam uma sensação de prazer e recompensa. Assim, quando se deixa de fumar, os alimentos podem ser usados também como um substituto do ato de fumar, melhorando o humor e a irritabilidade.

Todas as pessoas aumentam de peso igualmente quando deixam de fumar?

Há pessoas que têm um maior risco de aumentar o peso quando deixam de fumar, por exemplo:

Quem fuma muito, especialmente mais de 25 cigarros por dia;
As mulheres;
Quem tem <55 anos de idade;
Os afro-americanos;
Quem tem maior receio de aumento de peso;
Os sedentários;
Quem sofre alterações do comportamento alimentar.

Intervenção nutricional

O controlo de peso através de uma restrição energética não é aconselhado durante o período em que se está a deixar de fumar, uma vez que as exigências mentais e emocionais desta restrição podem comprometer o sucesso da abstinência, complicando ainda mais todo o processo.

Assim, é aconselhado que durante os primeiros 3 meses (período normal do aparecimento dos sintomas de abstinência), o foco seja apenas em largar o tabaco e não no controlo do peso. Este período poderá ser maior ou menor, dependendo de caso a caso, sendo o recomendado iniciar o processo de emagrecimento apenas quando a pessoa estiver totalmente confortável em deixar o tabaco.

De qualquer das maneiras, é recomendado desde o início de todo o processo, seguir um estilo de vida saudável, através da prática de atividade física regular e adoção de hábitos alimentares saudáveis.

Recomendações alimentares

Como já foi referido anteriormente, não é recomendado fazer dietas restritivas com foco em perda de peso inicialmente quando se deixa de fumar. No entanto, continua a ser importante seguir algumas recomendações alimentares durante todo o processo, de forma a prevenir um ganho de peso excessivo e adotar medidas para controlar o apetite (que vai estar aumentado).

Seguem algumas recomendações:

Distinguir a fome física da fome emocional e compulsão alimentar: quando sentir fome sem sentir desconforto gastrointestinal e dores de cabeça, provavelmente é fome emocional e não fome fisiológica. Neste casos, aguarde cerca de 15 minutos e tente ocupar-se com outros pensamentos e outras tarefas.

Anote as horas de maior compulsão para fumar: nestes momentos é importante ter sempre disponível pastilhas elásticas sem açúcar ou frutos gordos em quantidades moderadas (nozes, amêndoas, avelãs, amendoins, …). Estes ajudam a ter as mãos ocupadas e a mastigação ajuda a não comer demasiado e a reduzir a sensação de apetite.

Siga as recomendações da Roda dos Alimentos.

Faça várias refeições ao longo do dia (polifracionamento alimentar): quando se deixa de fumar, os alimentos têm um cheiro e um sabor mais agradáveis e os sintomas de privação da nicotina como a ansiedade, craving (forte compulsão em fumar) e o aumento de apetite levam a que haja uma maior vontade de comer. Fazer pequenas e várias refeições e lanches ao longo do dia, ajuda no controlo destes sintomas e, por conseguinte, a não comer em excesso.

Opte por alimentos com maior teor em proteína e fibra ao longo do dia: estes nutrientes atrasam o esvaziamento gástrico, contribuindo assim para o aumento da saciedade (diminuem o apetite). Assim, sentirá menos fome entre as refeições e terá menos vontade de consumir alimentos calóricos.

Beba líquidos ao longo do dia e faça da água a sua bebida preferida: a água ajuda a libertar a nicotina e os seus metabolitos do organismo, nos primeiros dias de cessação. Para além da água, as infusões sem açúcar são boas alternativas. Os sumos de fruta natural, quando consumidos de forma moderada, poderão também ser boas opções.

Evite bebidas com cafeína: o café, chás verde e preto, refrigerantes e bebidas energéticas com cafeína podem despoletar sintomas como a ansiedade que é muitas vezes um efeito secundário da ausência da nicotina. Opte por versões descafeinadas destas bebidas, para evitar esse efeito.

Evite as bebidas alcoólicas: o álcool cria um défice de oxigénio, devido a uma diminuição da saturação da hemoglobina na corrente sanguínea, que pode prejudicar a concentração e desencadear uma maior vontade de fumar e comer.

Pratique atividade física de forma regular: enquanto a fome está associada a períodos de maior compulsão em fumar, é sabido que a prática de atividade física diminui a ansiedade e a vontade de fumar. Para além disso, a atividade física diária ajuda a manter um peso corporal saudável, a aliviar o stress e a aumentar a autoestima.

Conclusão

O ganho ponderal quando se deixa de fumar é apontado como uma consequência em cerca de 84% das pessoas que deixam de fumar.

Apesar do aumento de peso estar fortemente associado, é importante referir que os benefícios da eliminação do consumo de tabaco superam quaisquer riscos que possam surgir. Por este motivo, importa reforçar a importância da adoção de hábitos alimentares saudáveis, de forma a contrair e a prevenir o ganho de peso.